POBRES SIM, MATUMBOS NÃO!

A vice-directora geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), Antoinette Sayeh, defende o papel desta organização financeira “de último recurso” em África, salientando que os empréstimos permitem evitar consequências “mais desastrosas” para a economia e os mais vulneráveis. Em termos práticos, os ricos vão continuar a ser ainda mais ricos, e os pobres ainda mais pobres.

Em entrevista à Lusa no âmbito de uma visita esta semana a Angola, Antoinette Sayeh elogiou (o que revela o poder dos poucos que têm milhões e o fim da linha para os milhões que têm pouco ou… nada) as autoridades do MPLA (no poder há 49 anos), incentivando-as a prosseguir (ou, finalmente, iniciar) reformas, e considerou que o facto de estas terem, “num contexto muito desafiante”, assimilado “de forma sólida” o programa de assistência financeira foi um factor critico para o seu sucesso.

“Vimos isso ao longo da implementação do programa, num contexto muito desafiante, com múltiplos choques, desde a pandemia, que obrigou a alguma recalibragem para continuar a responder a desafios ainda muito difíceis, e um trabalho muito próximo com as autoridades”, destacou, salientando que o programa esteve focado na estabilidade macroeconómica já que Angola, como pais exportador de petróleo está particularmente susceptível a choques do preço.

Questionada sobre se é preciso um novo programa, a responsável considerou que actualmente não, tendo em conta as necessidades de financiamento da balança de pagamentos, e disse que as autoridades não abordaram o FMI nesse sentido.

A também ex-ministra das Finanças da Libéria abordou o papel do FMI nos países africanos, considerando que, nos últimos quatros anos de choques múltiplos, demonstrou ser “uma rede de segurança”, sobretudo para países que têm poucos fundos de reserva.

Recorde-se que a “rede de segurança”… segura os que têm pelo menos três refeições por dia, mas deixa que passar todos aqueles (mais de 20 milhões no caso de Angola) que de tão esqueléticos que estão passam pela rede como se ela não existisse.

“Vimos, neste período, um aumento significativo das necessidades de financiamento e concedemos 58 mil milhões de dólares de empréstimos (53,67 milhões de euros) à África subsaariana, ao mesmo tempo que fornecemos assistência técnica para reforçar as políticas macroeconómicas”, adiantou.

Esta região, realçou, é a que mais beneficia de assistência técnica e formação do Fundo. Pois. E como, na sua génese, o FMI existe para dar uma salsicha a quem lhe der um porco (macroeconomia), mantém vivos e sustenta os regimes cleptocráticos e esclavagistas, todos eles donos de enormíssimas varas (conjunto de porcos).

Sobre as criticas à austeridade associada aos programas do FMI, Antoinette Sayeh lembrou que a maioria dos países recorrem à instituição quando já estão em crise ou perto da crise, sendo o Fundo “quase um credor de último recurso” para países que já não conseguem outro tipo de financiamentos e permite responder a necessidades imediatas, como por exemplo o pagamento de salários.

É verdade. No intuito de dar alguma fuba e peixe seco aos povos vítimas da cleptocracia e do esclavagismo dos regimes ditatoriais sustentados pelo Ocidente (sobretudo pela Europa e EUA), o FMI e o Banco Mundial “castigam” igualmente os dirigentes africanos, impondo-lhes uma dieta: trufas pretas, caranguejos gigantes, cordeiro assado com cogumelos, bolbos de lírio de Inverno, supremos de galinha com espuma de raiz de beterraba e queijos acompanhados de mel e amêndoas caramelizadas e umas garrafas de Château-Grillet…

“O financiamento do FMI permite evitar consequências mais desastrosas para a economia e para os mais vulneráveis”, observou Antoinette Sayeh passando assim um atestado de menoridade intelectual e de matumbez a esses “mais vulneráveis” que, apesar do “magnânimo” e já antigo suposto apoio do FMI, continuam a ser gerados com fome, a nascer com fome e a morrer, pouco depois, com… fome.

A responsável realçou ainda que os recursos do FMI pertencem aos 190 estados-membros que integram o Fundo e “é importante que sejam salvaguardados para as necessidades de outros países, e isso é permitido pela condicionalidade”.

Por outro lado, “os países querem também algumas garantias de que o financiamento que contraíram estará disponível e as condições que são acordadas para restaurar a estabilidade macroeconómica, quando são implementadas, permitem garantir aos países que os recursos estarão lá”.

Por último têm também um efeito catalítico, segundo Antoinette Sayeh, já que facilitam o acesso o outro financiamento e outras instituições financeiras internacionais, dando “algum conforto” de que as reformas serão implementadas e vão ajudar o país a regressar à estabilidade e sair da crise.

“Daí que esta condicionalidade associada aos nossos empréstimos, resulte melhor quando é assimilada pelos países como foi o caso em Angola”, sublinhou a vice-directora do FMI.

Antoinette Sayeh reconheceu que a África subsaariana precisa de “significativos” níveis de financiamento, e que a China desempenhou um papel importante com financiamentos alargados que incluem, por exemplo, infra-estruturas, ao contrário dos do FMI que são concessionais (empréstimos com condições mais favoráveis do que as de mercado, caracterizados por taxas de juros baixas e maior período de pagamento) e respondem às necessidades da balança de pagamentos.

Assumiu também que a vulnerabilidade à divida em África é “alta”, recomendando que os países sejam cuidadosos quanto aos níveis de divida que contraem, tendo em conta que o rácio face ao Produto Interno Bruto (PIB) quase duplicou nos países de baixos rendimentos nos últimos dez anos, disparando de 30% para 60%.

“Um número significativo de países de baixos rendimentos estão em níveis de sobre-endividamento”, alertou.

Antoinette Sayeh destacou que o FMI está agora a ajustar os limites de empréstimos para esses países no contexto de acordos como o PRGF (Facilidade de Redução da Pobreza e Crescimento Económico) que é a origem dos empréstimos concessionais para países de baixos rendimentos.

“Esta facilidade não tem juros associados e estamos em processo de rever (os limites) para determinar que outros ajustamentos precisamos de fazer para responder às necessidades dos países da Africa subsaariana”, disse.

A responsável do FMI destacou também o novo acordo RSF (Facilidade de Sustentabilidade e Resiliência), um instrumento com maturidades mais longas, direccionado para países confrontados com novos desafios como alterações climáticas ou preparação para pandemias, ao abrigo do qual já concederam 18 empréstimos, metade para África subsaariana, ilustrando desta forma a “agilidade” do Fundo para responder as necessidades desta região.

Antoinette Sayeh lamentou que a África subsaariana beneficie apenas de 3% dos fluxos de investimento estrangeiro a nível mundial. “Pode fazer muito melhor”, frisou, realçando que os investimentos em recursos naturais podem também ser benéficos, dependendo da forma como são usados.

“Não são necessariamente maus e os países (com estes recursos) têm uma vantagem competitiva”, disse.

No caso de Angola, assinalou que o país trilhou “um longo caminho” e conseguiu fazer reformas consideráveis no lado fiscal e da política monetária, defendendo igualmente políticas mais atractivas para investidores fora do sector dos recursos minerais.

Folha 8 com Lusa

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